segunda-feira, 28 de abril de 2008

CON TE PARTIRO

De quando em vez parto.
Procuro horizontes longínquos
Preciso de horizontes longínquos
Para entender e desejar o meu.

De quando em vez parto-me.
Em horizontes longínquos
Por horizontes longínquos
Que nada têm de meu.

De quando em vez parto-te.
Quando me esperas chegada
E eu ausente e calada
Em horizontes longínquos
Presa em horizontes longínquos
Longe e distante dos teus.


Do Blog “Erotismo na cidade”

quinta-feira, 24 de abril de 2008

SE TU VIESSES

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,

A essa hora dos mágicos cansaços,

Quando a noite de manso se avizinha,

E me prendesses toda nos teus braços...

Quando me lembra: esse sabor que tinha

A tua boca... o eco dos teus passos...

O teu riso de fonte... os teus abraços...

Os teus beijos... a tua mão na minha...

Se tu viesses quando, linda e louca,

Traça as linhas dulcíssimas dum beijo

E é de seda vermelha e canta e ri

E é como um cravo ao sol a minha boca...

Quando os olhos se me cerram de desejo...

E os meus braços se estendem para ti...

Florbela Espanca

quarta-feira, 23 de abril de 2008

MUSICA PARA UM FIM DE SEMANA PROLONGADO

RETRATO DE CORPO INTEIRO

No azul do teu peito
ensolarado
há espelhos de cristal
multiplicando imagens.
Emergem risos
lágrimas
promessas
olhares infantis
perdidamente
infinitamente
apaixonados
adolescentes.
A vida renasce
das tuas mãos
tremulas
entrelaçadas
— há muito tempo entrelaçadas —
Reencontradas.
No espaço secreto
da memória,
nosso retrato
- De corpo inteiro -
É o quadro mais bonito
que se pode iluminar.


Anna Maria Feitosa

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Aznavour e Minelli para começarmos bem a semana

sábado, 19 de abril de 2008

Hora da saudade: lembram-se deste dueto?

IL FAUT SAVOIR

CANÇÃO NA PLENITUDE

Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)
O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.


LYA LUFT

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Nota

Houve uma intromissão de um texto que não deveria ter aparecido aqui e que não tenho ideia nenhuma de ter postado. Peço desculpa ao anónimo que o comentou mas tive que o eliminar porque não estava aqui a fazer nada. Esse não é o objectivo deste blog

terça-feira, 15 de abril de 2008

VALSA - CHOPIN para acompanhar o voo de busca da gaivota

Graal

As gaivotas falaram-me de ti
Com palavras desenhadas na areia
Ainda molhada da maré.
Disseram-me que contavas histórias remotas
Construídas sobre mitos
Que guardavas fechados
Para os entregares a alguém
Que como tu
Também partilhasse o desejado
E quisesse compreender o incompreensível.

Não sei porque me escolheram
Para confiarem o teu segredo
Mas cada uma repetiu-mo baixinho
À medida que o bando se levantava.
A última, já de longe, disse-me para ir atrás de ti.

Procurei-te na praia.
Esperei-te junto ao mar
No luar de Agosto e nos poentes de Outubro.
Acreditava que as gaivotas iam voltar
Para me confiarem o lugar onde te escondias.
Nenhuma voltou àquela praia.

Tentando decifrar a mensagem das gaivotas
Parti para dentro de mim
Mergulhei no mundo dos meus heróis e utopias,
Menestréis e sonhadores,
Pensando que através dessa loucura intemporal
Me aproximasse de ti
E que dessa forma achássemos,
No nó das duas procuras,
O que ambos desejamos:
O segredo do Graal.


Mariamar

Seja bem regressada

A nossa irmã Gaivota do Sul já voltou de um belíssimo fim de semana alongado nos Açores. Esperemos que venha retemperada e pronta para dar notícias. Um bater de asas de todas nós para ela

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Ternura

O impossível carinho

Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura

Ah se em troca de tanta felicidade que me dás
Eu te pudesse repor
- Eu soubesse repor -
No coração despedaçado
As mais puras alegrias de tua infância!

Manuel Bandeira

A MINHA PÁTRIA É A LÍNGUA PORTUGUESA

… Assim escreveu Fernando Pessoa, em 1931, estabelecendo a união entre os conceitos de pátria e língua. Esta frase veio-me à ideia hoje ao pensar num famigerado acordo ortográfico que foi estabelecido, em 1990, sem que os portugueses tivessem sido ouvidos, e que, por ainda não estar ratificado em Portugal, o novo Ministro da Cultura se prepara para aprovar e implantar. Segundo foi estabelecido, aquele documento pretende defender a “unidade essencial da língua portuguesa e o aumento de seu prestígio internacional pondo um ponto final na existência de duas normas ortográficas divergentes e ambas oficiais: uma no Brasil e outra nos restantes países de língua portuguesa”. Ou seja portugueses, brasileiros e africanos das ex-colónias, vão ter que escrever todos da mesma maneira.
Este espaço de 18 anos em que o dito cujo tem estado em banho-maria, alimentado em combustão lenta por algumas intervenções dispersas no tempo, é revelador da insegurança de quem o traçou. Se era bom e necessário, porque não o assinaram logo que terminado? Quantos governos por ele passaram sem que deles se lembrassem, se é que o viram? A única explicação que encontro para isso é o receio que os seus responsáveis têm da reacção à sua aplicação porque ele revela uma tremenda falta de respeito pela língua falada e escrita em Portugal, que sendo a original, a mãe, é justamente aquela que mais variações sofreu. Assim enquanto no Brasil se irão verificar apenas 0,5% de alterações, entre nós elas serão de 1,6%. Porque cedeu tanto Portugal? Há quem diga que foi a força das editoras brasileiras. Talvez… Graças a Deus que as cedências não foram feitas tomando como padrão a expressão geográfica de ambos os países. A ser assim nós teríamos desaparecido e teríamos de falar brasuca, qual personagem de telenovela. Num momento em que se toma a Espanha como exemplo de país em grande evolução deveríamos reparar quantas normas diferentes tem o castelhano. Só no Word do Windows instalado no meu computador (e nos de toda a gente) existem pelo menos 19 dicionários de castelhano, tantos quantos os países em que pela América central e do sul ele é falado. Vão lá ver. Se há normalização em Espanha não se nota.
A grande riqueza da língua portuguesa reside justamente na sua capacidade de absorção de termos de outras línguas. Foi assim que ela, nascida num berço de latim, cresceu com os termos germânicos, através dos bárbaros invasores, e orientais, pela instalação dos mouros no nosso território, povos que em nenhum momento apagaram a língua que encontraram mas, antes pelo contrário, a respeitaram adoptando-a e enriquecendo-a. Foi assim que ela chegou às nossas ex-colónias e ali assentou arraiais alimentando-se com mais termos dessas terras. Esses povos coloriram-na com os sotaques e temos locais e ela ganhou o calor e a cor daquelas gentes. Tornou-se mais rica e maleável. A diáspora portuguesa levou-a aos quatro cantos do mundo e hoje, depois do inglês e espanhol é a mais falada, tal como está. E está muito bem. Pô-la dominada por adaptações feitas por povos mais recentes é de certo modo diminuí-la tornando-a um idioma secundário.
Cá por mim, vou borrifar-me para o dito acordo. Não vou tirar o c ao de facto porque fato para mim é coisa de vestir. E língua é coisa que, ao contrário do vestuário, não tem moda. É intemporal e eterna enquanto houver alguém que a fale, seja de que maneira for. Os anos que levaram a pensar em assinar o referido acordo fazem-me pensar, e não devo estar errada, que a sua aplicação não será para o meu tempo. Os meus bisnetos que se cuidem, porque os netos também já devem passar impunes. Estes, creio, até lhe vão passar ao lado pois já inventaram um português paralelo: o da escrita dos sms e mensagens do Messenger que só eles entendem e que até tem uma certa lógica fonética.
Se me obrigassem agora a mudar a minha língua voltaria a ficar expatriada, porque a minha pátria é a língua portuguesa. Não aquela que os acordos determinam mas aquela com que cresci e me conta a história de um país que se fez sozinho e foi navegante e aventureiro.

(in Matosinhos Hoje - 15/4/2008)



domingo, 13 de abril de 2008

O mar e tu

Sabíamos do mar sem o sabermos

Sabíamos do mar sem o sabermos,
do mar dos mapas, da cor azul do mar,
dos naufrágios no mar,
do sol solto no mar.
Sabíamos do mar sem o sentirmos

nos poros dilatados pelo mar,
o verdejante mar escalando as montanhas
tão bruscas como o sal.
Sabíamos do mar em sinuosos sinos

assinalando a noite
com corações arrepiados,
abertos como mãos
sulcadas de cabelos e molhadas
de rugas e escamas.
Sabíamos do mar em signos, símbolos,

tropos e metáforas.

Sabíamos do mar?
Sabíamos o mar.
Sabíamos a mar


António Rebordão Navarro

quinta-feira, 10 de abril de 2008

GAIVOTA

Se querem ter um momento de deleite puro cliquem no endereço abaixo e depois deixem-se levar pela voz que ouvirem a cantar a nossa "Gaivota". Será que podemos dizer que o fado é um sentimento exclusivamente português?


http://br.youtube.com/watch?v=xego6ePlhFE

quarta-feira, 9 de abril de 2008

É URGENTE O AMOR - Eugénio de Andrade

terça-feira, 8 de abril de 2008

Não te amo mais.
Estarei mentindo e dizendo que
Ainda te quer como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...

OBS: Agora leia esta poesia de baixo para cima.
Pura arte... pura genialidade...

domingo, 6 de abril de 2008

Back Home

Para as gaivotas que voltaram

Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa, compro um livro, entro no
amor como em casa.

Manuel António Pina

sexta-feira, 4 de abril de 2008

JUST IN TIME

Benvinda, irmã gaivota do sul

Regresso a casa

regressar a casa
despir o véu da rua
subir os outros
degrau a degrau
deixá-los
no cimo dos dias
ali
imóveis, pintados
sem doerem
e ir à procura das palavras
das fiéis palavras
que nos esperam
que nos esperaram sempre
com um vinho forte na mão
uma droga
ou um sonho
ou apenas
um sonho
ou então um cavalo
um louco cavalo
uma máquina iluminada
de fugir
de ir
pelo gume mais aceso das montanhas
e voltar
pela maré serena
dos rios

gil t. sousa

EM FIM DE TARDE A LEMBRAR SETEMBRO

NÓS QUANDO ESTAMOS SÓS

A sós
como duas gaivotas
na solidão do céu,
em pleno mar,
sonhando no ar...

A sós,
lado a lado, sem alarde,
como dois pássaros num alto ramo,
ao cair da tarde...

A sós
como duas mãos quando se procuram
e se encontram,
sem voz...

Como eu e tu
quando somos nós
a sós...

quinta-feira, 3 de abril de 2008

A Charlot, o eterno miúdo fantasiador

Os meus comentadores são imparáveis! Bela poesia de Torga para o bando

BRINQUEDO

Foi um sonho que eu tive:
Era uma grande estrela de papel,
Um cordel
E um menino de bibe.

O menino tinha lançado a estrela
Com ar de quem semeia uma ilusão;
E a estrela ia subindo, azul e amarela,
Presa pelo cordel à sua mão.

Mas tão alto subiu
Que deixou de ser estrela de papel.
E o menino, ao vê-la assim, sorriu
E cortou-lhe o cordel.

Miguel Torga

3 de Abril de 2008 1:01

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Que tal continuarmos com Neruda?

Isto foi o comentário de um anónimo. Vale um lugar de primeira

A palavra

Pablo Neruda


... Sim Senhor, tudo o que queira, mas são as palavras as que cantam, as que sobem e baixam ... Prosterno-me diante delas... Amo-as, uno-me a elas, persigo-as, mordo-as, derreto-as ... Amo tanto as palavras ... As inesperadas ... As que avidamente a gente espera, espreita até que de repente caem ... Vocábulos amados ... Brilham como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal, orvalho ... Persigo algumas palavras ... São tão belas que quero colocá-las todas em meu poema ... Agarro-as no vôo, quando vão zumbindo, e capturo-as, limpo-as, aparo-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas ... E então as revolvo, agito-as, bebo-as, sugo-as, trituro-as, adorno-as, liberto-as ... Deixo-as como estalactites em meu poema; como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes da onda ... Tudo está na palavra ... Uma idéia inteira muda porque uma palavra mudou de lugar ou porque outra se sentou como uma rainha dentro de uma frase que não a esperava e que a obedeceu ... Têm sombra, transparência, peso, plumas, pêlos, têm tudo o que ,se lhes foi agregando de tanto vagar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto ser raízes ... São antiqüíssimas e recentíssimas. Vivem no féretro escondido e na flor apenas desabrochada ... Que bom idioma o meu, que boa língua herdamos dos conquistadores torvos ... Estes andavam a passos largos pelas tremendas cordilheiras, pelas .Américas encrespadas, buscando batatas, butifarras*, feijõezinhos, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele apetite voraz que nunca. mais,se viu no mundo ... Tragavam tudo: religiões, pirâmides, tribos, idolatrias iguais às que eles traziam em suas grandes bolsas... Por onde passavam a terra ficava arrasada... Mas caíam das botas dos bárbaros, das barbas, dos elmos, das ferraduras. Como pedrinhas, as palavras luminosas que permaneceram aqui resplandecentes... o idioma. Saímos perdendo... Saímos ganhando... Levaram o ouro e nos deixaram o ouro... Levaram tudo e nos deixaram tudo... Deixaram-nos as palavras.

2 de Abril de 2008 13:58

terça-feira, 1 de abril de 2008

A ternura na voz da grande Ella

As pequenas gavetas do amor

Se for preciso, irei buscar um sol
para falar de nós:
ao ponto mais longínquo
do verso mais remoto que te fiz
Devagar, meu amor, se for preciso,
cobrirei este chão
de estrelas mais brilhantes
que a mais constelação,
para que as mãos depois sejam tão
brandas
como as desta tarde
Na memória mais funda guardarei
em pequenas gavetas
palavras e olhares, se for preciso:
tão minúsculos centros
de cheiros e sabores

Só não trarei o resto
da ternura em resto esta tarde,
que nem nos foi preciso:
no fundo do amor, tenho-a comigo.
quando a quiseres.

Ana Luísa do Amaral