segunda-feira, 9 de julho de 2007

REENCONTRO



Vários pensadores se assumem, ou são assumidos por nós, como os verdadeiros e originais autores da célebre máxima ” Nunca se deve voltar ao local onde fomos felizes”. Confesso que a primeira vez que a li achei que as coisas não deviam ser bem assim. Certamente, até então, eu já deveria ter voltado a muitos locais onde fora feliz e não me lembrava de alguma vez ter sentido que isso me desagradara. Mas o certo é que aquela ideia me ficou na cabeça e mexeu comigo. E, pior ainda, pouco tempo depois, tive a prova. Muitos dos meus momentos de grande prazer estão ligados à minha infância. Um deles foi um período em que tinha todas as razões para me sentir infeliz: estava doente (com a celebérrima primo infecção que a minha geração conheceu) e afastada dos meus pais que, por ordens do saudoso do Dr. Barros Nobre, me tinham enviado para casa de uma tia da minha mãe, a tia Ana, que morava em S. Marinha, um lugar de, Nespereira, localizado num caminho, não numa estrada principal, que ligava Lousada a Penafiel. Apesar dessas contingências todas a que acrescia uma dieta de engorda (quem diria que um dia iria voltar à dieta, mas para perder quilos !!!), de restrição de leituras para não me cansar (coisa que nunca deixei de fazer pois acabei por descobrir a pequena biblioteca da minha tia, composta pelas histórias de tudo quanto era santo mártir e a que eu roubava uns volumes que lia, às escondidas debaixo dos lençóis, durante o descanso da tarde), eu fui extraordinariamente feliz. A tia era um espanto de bondade e de cuidados comigo, a canalha local nunca fugiu da doentinha e brincávamos todos juntos, correndo pelos campos, roubando fruta até ao próprio abade da freguesia e assistindo às aulas de catequese no terreiro da casa sentados em bancos corridos. Aprendi o que era uma desfolhada nas longas noites de cantares na eira dos vizinhos, acompanhei todo o trabalho do linho, do cultivo até ao fio, passando pela ripagem, espadelada e fiação, bebi vinho doce com figos, que segundo os locais matava… enfim, tive uma vida que desconhecia e me encantou. Com a morte da minha tia deixámos de lá ir. Há 3 ou 4 anos, íamos a fazer o percurso de Lousada para Penafiel e tive a louca ideia de pedir ao meu marido para passarmos por Nespereira. Apanhei uma das maiores desilusões da minha vida! O caminho que saía de perto de Lousada é agora uma parte da sua malha urbana. Não consegui descortinar a igreja, que me lembrava ser mesmo ao pé da estrada, a casa da minha tia desapareceu e, no que julgo ser o seu lugar, há um esplêndido prédio de andares. Só consegui localizar uma capela, a de S. Isabel e uma enorme bouça pertencente a uma quinta já mesmo na proximidade da estação de Penafiel. Fiquei siderada. E jurei não mais lá voltar, lá e a qualquer outro lugar que para mim seja mítico.
Há dias recebi de uma colega do meu curso de História, feito entre 1980-84, quando eu passei da trintena para a quarentena e os meus colegas da dezena para a vintena. Por outras palavras, a maioria deles tinha idade para ser minha filha. Dizia-me a Paula Carreira, quase tão revolucionária quanto eu naquela turma, que era a altura de nos juntarmos e tentarmos localizar os colegas dispersos por este país e não só e fazermos uma reunião de curso. Ainda não nos encontramos cara a cara, tem sido só por e-mail até agora. Mas já temos dado umas quantas gargalhadas virtuais, falámos com colegas com quem não estávamos há anos e recordámos tanta coisa… A lista, ainda incompleta, ultrapassou rapidamente as trinta adesões. Uma verdadeira “onda azul” (de Letras). O mais difícil parece que vai ser acertarmos todos numa data e local. A intenção já se tornou acção. Só falta agora mesmo que o Reencontro seja mesmo um voltar a um tempo feliz. Afinal a frase sobre a qual me debrucei inicialmente fala de locais onde fomos felizes. E nós vamos recordar tempos. Para afastar o esconjuro, juramos que não vamos por os pés na Faculdade.

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