domingo, 22 de julho de 2007

DESABAFO PESSOAL PARA ESQUECER O DESAFORO COLECTIVO

Já tinha ouvido vagamente na televisão que iria haver umas mudanças na Assembleia da República. Entre elas chamara-me a atenção um referido aumento de assessores para os deputados. Como nos vamos habituando, desde o início desta hipótese de democracia, aos “jobs for the boys”, achei que isso iria significar mais uns empregos para meia dúzia de primos, conhecidos ou “clientes” (na acepção romana do conceito), mas que seria coisa “piquena”, tipo aquelas que aparecem sem se dar por elas. Eis senão quando num jornal online de 20.7 me confrontei com esta notícia que vos repasso. Informo que o itálico é meu:

«Um assessor para cada deputado!

Os deputados à Assembleia da República vão passar a ter um assistente individual. A medida ficou ontem consagrada num projecto de alteração ao Estatuto dos Deputados, que subirá hoje a votação. Sem data para ser aplicada, a norma deverá ser "concretizada gradualmente", com o apoio dos assessores dividido "numa primeira fase" por vários deputados. Actualmente, a AR deixa aos partidos o critério sobre o número de pessoas que contratam para apoio técnico. O que está pré-definido é o montante financeiro que cada um tem para esta área, calculado em função do número de votos nas eleições – com esse montante, cabe então aos partidos decidir quantos funcionários contratam. Actualmente, o conjunto de todos os grupos parlamentares contará bem menos de 100 assessores – um número que, com o novo estatuto, passará para os 230.
IN DIÁRIO DE NOTÍCIAS 19.07.2007 »

Tenho a certeza que qualquer português como eu, dos que não percebem nada de política, mas que tem vindo sistematicamente a apertar o cinto porque o nosso governo com a obrigação de justificar o estado das nossas finanças perante a UE, o tem conseguido à custa do sacrifício de quase todo um país (no quase ficam os que não pagam impostos, ganham mais dos que os governantes, etc., etc. No resto ficam os pensionistas, os desempregados, os funcionários supranumerários ou deslocados “à força”, os que se esfalfam a trabalhar para não dever nada a ninguém, os jovens em busca do primeiro trabalho, etc., etc.), mas como ia dizendo, todo um país fica espantado com semelhante situação que para além de ser uma falta de respeito a todos é um desaforo político da pior espécie. Se perguntarmos aos cidadãos comuns a opinião que têm sobre os nossos deputados a resposta que obtemos, na maioria dos casos, elaborada pela análise pessoal de cada questionado à actuação dos nossos representantes naquele órgão e às sucessivas imagens que a TV nos mostra de um hemiciclo vazio (já não conseguimos engolir as justificações da ausência pelo trabalho nas variadas comissões) é que os nossos eleitos trabalham poucos dias e poucas horas e que do seu trabalho não vemos frutos. Mesmo quando nas sessões plenárias, assistimos aos arremedos da oposição, a palavra final que todos temos de engolir, é a do Governo porque ele, como maioria, e ainda por cima surda, é quem MANDA. Não sei quem sugeriu esta ideia, mas estou segura que vai agradar muito aos senhores deputados, sobretudo àqueles que tem outros trabalhos por fora porque, segundo o dicionário que uso habitualmente, um assessor é um adjunto, um assistente, um auxiliar, um ajudante e até um suplente, em português vernáculo “um pau para toda a colher”. Em função disto pela primeira vez não haverá “Job for lhe bois”, mas “Boys for the jobs”.
Resta-me a esperança, porque sou optimista, que esta situação tenha sido levantada pelo próprio Primeiro Ministro que deve andar com a consciência pesada por ainda não ter criado todos os milhares de lugares de emprego que prometeu na sua campanha eleitoral e que, para não chegar ao fim da legislatura sem cumprir a sua propagandeada palavra, está a começar a actuar em conformidade tendo determinado a instituição destes mais de 130 postos de trabalho num departamento do próprio estado para assim dar o exemplo a todos os possíveis empregadores portugueses.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

O GLORIOSO CURSO DE HISTÓRIA DA FLUP 1980-84


REENCONTRO



Vários pensadores se assumem, ou são assumidos por nós, como os verdadeiros e originais autores da célebre máxima ” Nunca se deve voltar ao local onde fomos felizes”. Confesso que a primeira vez que a li achei que as coisas não deviam ser bem assim. Certamente, até então, eu já deveria ter voltado a muitos locais onde fora feliz e não me lembrava de alguma vez ter sentido que isso me desagradara. Mas o certo é que aquela ideia me ficou na cabeça e mexeu comigo. E, pior ainda, pouco tempo depois, tive a prova. Muitos dos meus momentos de grande prazer estão ligados à minha infância. Um deles foi um período em que tinha todas as razões para me sentir infeliz: estava doente (com a celebérrima primo infecção que a minha geração conheceu) e afastada dos meus pais que, por ordens do saudoso do Dr. Barros Nobre, me tinham enviado para casa de uma tia da minha mãe, a tia Ana, que morava em S. Marinha, um lugar de, Nespereira, localizado num caminho, não numa estrada principal, que ligava Lousada a Penafiel. Apesar dessas contingências todas a que acrescia uma dieta de engorda (quem diria que um dia iria voltar à dieta, mas para perder quilos !!!), de restrição de leituras para não me cansar (coisa que nunca deixei de fazer pois acabei por descobrir a pequena biblioteca da minha tia, composta pelas histórias de tudo quanto era santo mártir e a que eu roubava uns volumes que lia, às escondidas debaixo dos lençóis, durante o descanso da tarde), eu fui extraordinariamente feliz. A tia era um espanto de bondade e de cuidados comigo, a canalha local nunca fugiu da doentinha e brincávamos todos juntos, correndo pelos campos, roubando fruta até ao próprio abade da freguesia e assistindo às aulas de catequese no terreiro da casa sentados em bancos corridos. Aprendi o que era uma desfolhada nas longas noites de cantares na eira dos vizinhos, acompanhei todo o trabalho do linho, do cultivo até ao fio, passando pela ripagem, espadelada e fiação, bebi vinho doce com figos, que segundo os locais matava… enfim, tive uma vida que desconhecia e me encantou. Com a morte da minha tia deixámos de lá ir. Há 3 ou 4 anos, íamos a fazer o percurso de Lousada para Penafiel e tive a louca ideia de pedir ao meu marido para passarmos por Nespereira. Apanhei uma das maiores desilusões da minha vida! O caminho que saía de perto de Lousada é agora uma parte da sua malha urbana. Não consegui descortinar a igreja, que me lembrava ser mesmo ao pé da estrada, a casa da minha tia desapareceu e, no que julgo ser o seu lugar, há um esplêndido prédio de andares. Só consegui localizar uma capela, a de S. Isabel e uma enorme bouça pertencente a uma quinta já mesmo na proximidade da estação de Penafiel. Fiquei siderada. E jurei não mais lá voltar, lá e a qualquer outro lugar que para mim seja mítico.
Há dias recebi de uma colega do meu curso de História, feito entre 1980-84, quando eu passei da trintena para a quarentena e os meus colegas da dezena para a vintena. Por outras palavras, a maioria deles tinha idade para ser minha filha. Dizia-me a Paula Carreira, quase tão revolucionária quanto eu naquela turma, que era a altura de nos juntarmos e tentarmos localizar os colegas dispersos por este país e não só e fazermos uma reunião de curso. Ainda não nos encontramos cara a cara, tem sido só por e-mail até agora. Mas já temos dado umas quantas gargalhadas virtuais, falámos com colegas com quem não estávamos há anos e recordámos tanta coisa… A lista, ainda incompleta, ultrapassou rapidamente as trinta adesões. Uma verdadeira “onda azul” (de Letras). O mais difícil parece que vai ser acertarmos todos numa data e local. A intenção já se tornou acção. Só falta agora mesmo que o Reencontro seja mesmo um voltar a um tempo feliz. Afinal a frase sobre a qual me debrucei inicialmente fala de locais onde fomos felizes. E nós vamos recordar tempos. Para afastar o esconjuro, juramos que não vamos por os pés na Faculdade.

domingo, 1 de julho de 2007

HERÓIS OU ÍDOLOS

O conceito de herói, que herdámos da mitologia grega, aquele ser especial, impoluto, capaz de grandes façanhas, tem mudado muito. Digamos que tem vindo a alterar-se com os tempos e os homens. Cada sociedade teve os seus heróis. Uns permaneceram. Outros perderam-se, esgotando-se a sua memória com o passar dos anos. Cada um de nós teve ou tem ainda heróis particulares. E tal como acontece com os outros eles desaparecem ou acompanham-nos por toda a vida. Eu não fujo à regra. Também tive e tenho os meus heróis. Há dias, em conversa com um amigo (não poderia ser com uma amiga porquanto eu era dos poucos espécimes do meu sexo que liam aquela revista) recordámos com saudade o extinto “Cavaleiro Andante”. Para os que não sabem ou nunca o leram na sua criancice (se têm mais de 40/50 anos) o “Cavaleiro Andante” juntamente com o “ Mundo de Aventuras” foram duas das primeiras publicações de banda desenhada editadas em Portugal e que todas as semanas nos deliciavam com as suas narrativas em episódios, que nos obrigavam a esperar meses para conhecer o desfecho de cada uma delas. A minha preferência ia essencialmente para a primeira. Assim à distância recordo que as suas histórias não eram tão agressivas como as da segunda. E muitas delas eram de temática histórica, coisa de que já então eu gostava. A aventura que me impressionou mais fortemente foi a intitulada “Ala dos namorados” e que contava, em quadradinhos, a história da ala esquerda do exército português na batalha de Aljubarrota que era composta por jovens que, em comum, tinham a nacionalidade e viviam uma paixão. Eram seus chefes Mem Rodrigues e Rui Mendes de Vasconcelos. Já não recordo os pormenores da narrativa, mas os seus nomes fixei-os e coloquei-os no meu patamar de heróis não só pela coragem, mas também, e talvez sobretudo, pelo estado passional que viviam. Anos mais tarde, já mãe de filhas adolescentes, encontrei-me novamente com eles num trabalho que fiz sobre a crise de 1383-85, durante o meu curso de História. E aí perdi-os, ou melhor dizendo, desci-os do lugar em que os tinha posto porque descobri que eles tinham existido na realidade e como tal perderam aquela auréola de ficção que lhes dava brilho. E compreendi que os heróis são heróis enquanto seres tão perfeitos que só podem mesmo existir na fantasia. Ao contrário do que acontecia na antiga Grécia, o que hoje designamos por heróis são personagens reais cuja vida gostaríamos que fosse a nossa, de quem copiamos atitudes ou formas de vestir ou de pensar. Só que estes não são mais do que ídolos, seres que passamos a adorar porque se impõem por algo em especial, mas que, finda essa actividade ou alterado o sistema de vida, rolam direitinhos para a nossa lixeira pessoal, porque logo outros se impõem. A principal fonte de criação destes seres é a Media. Elevam-nos aos píncaros da celebridade, proclamam a originalidade do modelo e de repente, por algo que aconteceu ou não aconteceu ou se inventou que tivesse existido ou, sobretudo, que ocorreu em sentido oposto aos desígnios dos fazedores de ídolos, puxam-lhe o tapete e eles caiem fazendo-se pó. Vale tudo desde que se publique e dê dinheiro. Hoje não pode haver heróis porque todos temos pés de barro, não temos qualidades para sermos eternos e, à primeira, tropeçamos. E lá estará alguém a relatar o acontecido. O futebol está carregado de exemplos destes. A política também ai está representada. Nenhum estrato da sociedade, sobretudo a mais visível pela posição ou dinheiro, está livre disso. Esta semana um livro, discutível, vem por em causa a verdade da vida de Diana de Gales. Não me vou referir a ele. A altura para o seu lançamento foi estudada e bem preparada. O seu objectivo é denegrir alguém que foi um ídolo mundial no momento em que os seus filhos se preparam para festejar o que seria o seu 46º aniversário e os 10 anos da sua morte. É caso para dizer: aos fazedores de ídolos nem os fantasmas escapam…