segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

Igreja do Bom Jesus de Matosinhos

A GAIVOTA E O BOM JESUS
A gaivota planou sobre o telhado da igreja e aterrou no alto da torre. Sentiu o ar fresco da manhã que lhe arrepiou as penas e preparou-se para localizar os sítios onde se tinham passado todas as histórias que a mãe lhe contara. Eram histórias muito antigas do tempo em que naquela terra havia poucos homens e um rio que corria lentamente entre as duas margens guarnecidas de árvores frondosas. Agora havia muitas casas, muitos barcos, muito movimento. Iria ser muito difícil identificar os locais de todas as histórias apesar de se encontrar num ponto alto. A mãe levara-a muitas vezes ali. Dizia ela que aquele sítio era o mais importante de toda aquela terra porque a torre pertencia a uma igreja onde havia um Cristo muito especial, tão especial que chegara por mar à praia de Matosinhos e a sua fama fora levada até muito longe. A gaivota aninhou-se, fechou os olhos e, como num sonho, pareceu-lhe ouvir a voz da mãe:Quando Portugal acabara de nascer havia uma terra chamada Bouças que tinha uma praia muito grande de belas areias douradas. Um dia os homens-lavradores do lugar, que recolhiam lenha que as marés traziam, encontraram um estranho madeiro com forma humana, pregado numa cruz, mas sem um braço. Espantados, levaram-no para a sua igreja que ficava um pouco afastada do mar. Porque aparecera naquela terra, chamaram-lhe Bom Jesus de Bouças e ali o guardaram e rezaram à sua sombra. A sua fé nesse Cristo foi tanta, que foram recompensados anos depois, quando uma nova maré lhes trouxe o braço perdido e que eles nunca tinham conseguido substituir.Com o tempo, os homens começaram a descer a encosta daquela terra e a aproximarem-se mais da praia. Foram deixando de ser lavradores e passaram a ser pescadores. Construíram casas nas margens do rio e ali iniciaram uma nova vida e uma nova povoação. A velha igreja, em ruínas, foi abandonada, mas eles levaram o seu Cristo para uma outra igreja, que fora construída pela Universidade de Coimbra, a verdadeira dona daquela terra. E como esta se chamava Matosinhos, o Cristo passou então a ser conhecido por Bom Jesus de Matosinhos.E os homens-pescadores começaram também a ser vendedores de peixe. E depois construíram barcos. E Matosinhos cresceu de tamanho e importância. Agradecidos ao seu Bom Jesus, por tudo quanto lhes dera, os homens organizaram uma confraria para se protegerem e escolheram-no para padroeiro. Era um tempo em que os homens daquele país se começavam a aventurar pelo mar desconhecido e realizavam longas viagens durante as quais iam descobrindo muitas terras de que ninguém conhecia a existência. Essas viagens, feitas em barcos muito frágeis, eram muito perigosas e os homens tinham muitos medos. Por isso rezavam e pediam ao Bom Jesus de Matosinhos que os trouxesse de volta sãos e salvos para casa. E o Bom Jesus protegeu-os tanto que a sua fama se estendeu por todo o país e chegou também até ao outro lado do oceano Atlântico – ao Brasil, que era uma região muito rica. Para espalhar a bondade daquele Cristo e os milagres que ele fazia, um enviado da confraria embarcou para esse novo mundo. E assim muito mais gente lhe rezou e recebeu favores. Em sinal de agradecimento, os novos fiéis entregaram a esse mensageiro muito dinheiro para que em Matosinhos fosse possível construir uma igreja maior e mais rica do que a anterior. E para o terem mais perto e assim melhor o venerarem, a pouco e pouco os fiéis brasileiros foram-lhe levantando novas igrejas em alguns lugares desse enorme Brasil. Ao todo 26.E a gaivota lembrava-se que a mãe terminava aquela história dizendo sempre:Este Cristo de Matosinhos, que apareceu sem um braço, conseguiu reunir num abraço dois países de dois lados do mar.A gaivota ergueu-se, sacudiu as penas, levantou voo, atravessou a cidade e pousou devagarinho na praia onde sempre vivera, a mesma onde o Bom Jesus aparecera quando este país acabara de nascer.

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